quarta, 12 fevereiro 2014 12:28

Identidade

 
Olá a todos, leitores, ouvintes e demais amantes da música de dança, colegas cronistas e toda a equipa da 100% Deejay. Feliz 2014 a todos!
 
Na minha primeira crónica do presente ano, falarei de um assunto que aos poucos, está a acabar com algo bastante importante em todos os negócios, IDENTIDADE. Não só na música, mas também nos espaços.
Parece que neste momento, e em jeito de gíria, temos dois pesos, duas medidas:
 
    - Tudo ao molho e fé em Deus
    - Isto é o Tomorrowland
 
Pode parecer demasiado generalizado, mas não o é. Vamos por partes. No primeiro, temos as casas e os DJs que tocam tudo e mais alguma coisa. Da música pimpa portuguesa ao Electro/Progressive/EDM (call it what you want), passando pela musica brasileira (de quase todos os géneros), remixes de bradar aos céus de clássicos (a típica remix portuguesa com grooves afro), e não esquecendo claro, a vaga de música africana (dos afro-beats pimba à Kizomba, lá toca de quando em vez, um Liquideep, Blackcoffe???) que assaltou o país com as suas danças... peculiares. 
 
Ora isto não tem mal nenhum se se enquadrar no negócio a que a casa se propôs, e, claro, se feito com pés e cabeça. Tocar um "Animals" depois de um "Show das Poderosas" seguido de um "Baixó" com uma acapella pelo meio de Daft Punk é uma "sopa" que pode criar "enfartamento". As coisas feitas com nexo, sentido, neste tipo de casas/negócio, só têm a ganhar. A noite mudou mas há coisas que não, e os horários (sim, as pessoas chegam mais tarde, é verdade), sendo uma das coisas que prejudicou bastante, podem, se bem aproveitados, não prejudicar tanto como se julga. É uma questão de aproveitar certos estilos musicais para fazer as pessoas chegarem mais cedo. É possível, e eu já o vi feito em muito bom negócio por muito bom DJ que pela nossa noite ainda vai tendo... Identidade. O DJ residente deve proporcionar uma viagem ao público, uma sensação de bem-estar, tocar nas emoções e acima de tudo, fazê-lo se tiver mestria, com a sua identidade de encontro ao que se propõe o negócio do club onde trabalha.

A música mudou, os festivais, os clubs e até os próprios DJs, mas olhar só para um lado, acho que não é opção.

 
A segunda... bem, a segunda, é aquele típico trabalho de DJ que, ou começou há pouco tempo, ou então, quer agradar aos amigos que tal como ele, sonham com o festival Belga e com o Top 10 do Beatport. Cada qual com a sua ideologia e direito, mas esta opção para um DJ residente, pode não ser a melhor. Principalmente quando ainda com a casa a menos de meio gás, já vai para lá do "Land". Se esta é a identidade dele - ser residente - pode não ser a melhor opção, ou então como muitos fazem sabiamente, incutem o seu gosto e cunho aos clientes, de forma correcta, com mestria, podendo então tocar o que mais se gosta, não chocando com o ouvido e gosto do público a que o club se propôs agradar e cativar. Penso que ouvir o "Distorted Kick" da Spinnin' Records a noite inteira não é a ideologia de um club com... Identidade.
 
A música mudou, os festivais, os clubs e até os próprios DJs, mas olhar só para um lado, acho que não é opção. Portugal vive provavelmente a maior crise (não só económica), a nível de noite e de tudo o que engloba esta. Musical, temática, mas acima de tudo uma grave crise de identidade que leve as pessoas a querer dizer: "Vamos lá!". E neste aspecto, o DJ actual (salvo excepções como é lógico), não ajuda com a referida "sopa" ou a ilusão do palco "Tomorrowland" que em cima referi. 
 
Esta realidade já me fez pensar várias vezes porque ainda continuam artistas de outros estilos a produzir, a caminhar e a remar para um lado que parece condenado. Pois bem, não está condenado e recomenda-se. Há poucos dias, a senhora Roisin Murphy (a Diva dos Moloko), esteve a actuar na discoteca Lux em Lisboa, para uma casa cheia, e o que me arrepiou ver um vídeo de um Lux cheio a cantar a uma só voz "Forever More". Lux é um exemplo de uma casa com IDENTIDADE (sim, em letras maiúsculas). Quem não gosta não consome, mas quem gosta, sabe sempre que mesmo desconhecendo o que se vai passar, é dentro do que está habituado. Isto é Identidade. Isto é o que falta à noite portuguesa. Diversidade, identidade, qualidade a que se propõe o negócio, independentemente do que seja. Há espaço para todos, para todos os gostos, mas na minha modesta opinião, há que perceber a que cada tipo de cliente se quer chegar. O DJ pode e tem que ter um papel fundamental nesse aspecto, e muito sinceramente, faltam bons profissionais para fazer o "negócio" andar. 
 

(...) Isto é o que falta à noite portuguesa. Diversidade, identidade, qualidade a que se propõe o negócio, independentemente do que seja...

 
É lógico que existem muito boas excepções que fogem a esta crise de identidade. Negócios cimentados, outros mais recentes, sabem desde o porteiro ao DJ, ao que a casa se propôs e... são sucesso. Saber o que se quer e acima de tudo, saber o que se poder oferecer e fazer com o que se tem, necessita de uma liderança com mestria, seguida de uma equipa com vontade e a remar toda na mesma direcção. 
 
Um último reparo. Aos DJs que aceitam residências para não estarem em casa e depois não se predispõem a tocar dentro do enquadramento a que o negócio da casa se dirige, mais vale ficarem no quarto. Prejudicam a casa e a eles próprios. Penso que será melhor opção tentarem perceber onde podem mostrar o seu trabalho e o mesmo funcionar. Erros de casting podem acabar com carreiras e/ou negócios. É tudo uma questão de perceber onde nos enquadramos, qual é a nossa Identidade.
 
Saudações musicais.
 
Publicado em Massivedrum
sexta, 17 março 2017 21:21

O DJ toca ou passa música?

De vez em quando nas redes sociais vejo umas trocas de ideias mais acesas sobre esta questão. Há muitos anos atrás os DJs usavam normalmente a expressão “vou ali passar música...”, mas de há uns anos para cá, essa expressão transformou-se em “vou ali tocar...”. Qual das duas maneiras é a mais correcta para referir-se ao mesmo acto?
 
De um lado temos os músicos (e alguns músicos que também são DJs) que dizem que o DJ se limita a “passar a música dos outros”, do outro lado temos os DJs que dizem que não só tocam as músicas dos outros (ou as suas, caso sejam também produtores musicais) mas que também criam sonoridades novas, quando estão a actuar...
 
Sinceramente, acho que as duas afirmações estão correctas. É verdade que antes de aparecerem as novas tecnologias, as várias aplicações e controladores que agora podemos usar nos “sets” as possibilidades de criação eram muito mais limitadas, mas mesmo assim havia DJs que mesmo só com pratos e discos em vinil praticamente criavam novos temas, novas versões de temas, “remixes” na hora, com vários temas a tocar ao mesmo tempo. Lembro-me assim de repente do DJ Americano Jeff Mills a actuar dessa forma e na minha opinião isso é “tocar”, não é simplesmente o acto de “passar música”. Quem já assistiu a uma actuação dele a 4 pratos sabe do que estou a falar.
 
É verdade que nessa altura eram mais os casos em que o DJ “passava música” do que os em que “tocava”, mas mesmo assim usando “só” dois, três ou quatro pratos era possível (e alguns faziam-no) criar novas sonoridades, criar novos temas a partir outros já existentes. Isso não era a regra geral, é verdade, mas alguns DJs faziam-no e muito bem. 
 
Na minha opinião, hoje em dia é mais normal, por tudo o que usamos nas actuações, o termo “tocar” do que “passar música”. Ainda mais no caso daqueles DJs que praticamente só usam temas próprios e/ou “loops” e bases próprias e alguns temas de outros artistas num programa como o Ableton Live, criando sessões exclusivas com sonoridades novas, que muitas vezes até resultam em temas novos.
 

Com tudo o que temos à disposição neste momento para usar durante as actuações o limite é a nossa imaginação e criatividade!

 
Hoje em dia, com um computador portátil e um programa como o Traktor da Native Instruments (ou outro do género) é muito mais fácil conseguirmos criar uma versão nova, um momento “exclusivo” num set que provavelmente não se vai repetir noutro local. A Native Instruments até criou um formato exclusivo, os “STEMS” que basicamente são a divisão de um tema em quatro pistas separadas. Isto permite uma grande liberdade criativa já que podes usar o instrumental de um tema, uma voz de outro, um baixo de um terceiro e um sintetizador de um quarto e criar uma versão completamente nova de algo já existente ou mesmo um tema original, dependendo da tua imaginação! Isto já era também possível com o formato “Remix Sets” que a Native criou antes e que permite ter os temas divididos por “loops” para poder usar em diferentes combinações, mas com os STEMS penso que a facilidade em criar novas sonoridades é maior e mais imediata. 
 
Por isso, na minha opinião, a discussão entre se o DJ “passa música” ou “toca” é mais uma discussão “estéril”. Tal como dizer que “o verdadeiro DJ é aquele que não usa SYNC” ou “o verdadeiro DJ usa discos em vinil, não usa computadores...” entre outras discussões que de vez em quando aparecem nas redes sociais. Com tudo o que temos à disposição neste momento para usar durante as actuações o limite é a nossa imaginação e criatividade!
 
Carlos Manaça
 
(Carlos Manaça escreve de acordo com a antiga ortografia)
Publicado em Carlos Manaça
A minha crónica este mês é sobre aquilo que eu acho que pode vir a dar uma grande ajuda à sobrevivência das pequenas (e grandes) editoras como a Magna Recordings: o serviço de streaming. Com as vendas de música para download a descer de ano para ano (pelo menos é o que nos dizem as principais lojas online...) e o hábito cada vez mais generalizado das gerações mais novas de "sacarem" tudo grátis da internet, os serviços de streaming podem vir a ser a nossa "tábua de salvação" nos próximos anos. É um facto que é muito mais cómodo ouvir as músicas que queremos quando queremos, online, do que ter um monte de temas no telemóvel/iPad/computador, a ocupar espaço no disco (espaço que muitas vezes é limitado) e que, com o passar dos anos, se torna num problema, se não andarmos sempre a apagar o que já não ouvimos. E com o tamanho dos pacotes de dados oferecidos pelas principais empresas de telecomunicação hoje em dia, fazer streaming já não esgota os megas disponíveis, como acontecia há uns (poucos) anos atrás.

No entanto, o streaming já levantou problemas sérios entre os artistas/editoras e algumas das plataformas mais importantes, como é o caso do Spotify. Não podemos esquecer que estas empresas têm como objetivo principal o maior lucro possível, e ao terem um produto cujo número de plays está (quase) totalmente nas suas mãos, torna-se muito difícil para o artista/editora ter algum controlo sobre esses números. Na realidade, estas empresas pagam o que lhes apetece pagar. É certo que pelo contrato podes pedir uma auditoria aos números de plays, mas dificilmente os pequenos artistas/editoras têm recursos para o fazer e mesmo as grandes editoras tiveram problemas com isso. 

É conhecida a polémica do caso da cantora Taylor Swift que em 2014 retirou o álbum "1989" e todo o seu catálogo anterior do Spotify quando recebeu os primeiros relatórios de plays porque eram, segundo ela, "ridículos". Entre 2014 e 2017 todo o seu catálogo esteve fora do principal serviço de streaming (que neste momento já conta com mais de 100 milhões de usuários) o que desagradou à sua grande legião de fãs. Mas a explicação de Taylor Swift sobre os motivos dessa sua atitude fez, para mim, todo o sentido.

Segundo ela e o presidente da sua editora, era uma tremenda falta de respeito para as pessoas que tinham comprado o álbum completo em download por 12,99 dólares que os usuários do Spotify pudessem ouvir os mesmos temas, grátis, embora com anúncios entre os temas. Ou a pagar 9,99 dólares por mês no serviço premium, sem anúncios, para ouvir uma quantidade ilimitada de música, onde estariam incluídos os temas do novo álbum. E quando chegaram os primeiros relatórios de plays no Spotify do álbum "1989" que tinha acabado de vender nessa semana 1.3 milhões de cópias para download, foi a gota de água que a fez retirar todo o seu catálogo da principal plataforma de streaming. 

Segundo ela, só quando o Spotify pagasse "justamente, aos autores, editores, produtores, músicos, e a toda a gente envolvida no processo de criação musical de um álbum/single, é que voltaria a disponibilizar o seu catálogo no Spotify". Parece que isso foi conseguido em 2017 porque após uma renegociação do seu contrato, todo o seu catálogo voltou a estar disponível no Spotify, para grande alegria dos seus muitíssimos fãs no mundo inteiro.
 
Para facturarmos 1.300 euros relativos ao streaming de um tema, na Pandora teríamos que ter à volta de 87.500 plays e no Youtube 1.890.000 (!!). No Spotify são necessários aproximadamente 356.850 plays de um tema para podermos facturar os mesmos 1.300 euros, valor que obviamente estará sujeito aos respectivos impostos antes de chegar às nossas mãos.

Em 2015, e também depois de receber relatórios de plays de Spotify, que segundo eles eram "uma vergonha", Jay Z decidiu criar com Usher, Rihanna, Nicki Minaj, Madonna, Deadmau5, Kanye West, entre outros, o TIDAL, o "primeiro serviço de streaming totalmente controlado pelos artistas". Conseguiu ter, numa primeira fase, alguns lançamentos exclusivos, por alguns dias, mas as editoras proprietárias dos álbuns conseguiram, ao fim de algum tempo, disponibiliza-los nas restantes plataformas, o que levou a que a grande vantagem do TIDAL (a exclusividade) se perdesse em alguns dias. Obviamente que isso fez com que a nova plataforma "dos artistas e para os artistas" tivesse grandes problemas de afirmação num mercado já dominado pelo Spotify. O TIDAL apresentou por isso prejuízos crescentes desde 2015, tendo em 2017 vendido 33% à empresa de telecomunicações americana Sprint que injectou de imediato 200 milhões de dólares para viabilizar a empresa que já estava a ser acusada de falta de pagamento de royalties aos artistas e editoras...
É um facto que os pagamentos feitos aos artistas/editoras pelas plataformas de streaming, segundo os últimos dados, é ainda muito reduzido por cada play. Varia entre os 1,5 cêntimos pagos pela plataforma Pandora até aos 0,0066 cêntimos (!!) pagos pelo Youtube. O Spotify paga à volta de 0,0399 cêntimos por play e está mais ou menos a meio da tabela dos pagadores de royalties.

Para termos uma ideia mais concreta do que significam estes valores, para facturarmos 1.300 euros relativos ao streaming de um tema, na Pandora teríamos que ter à volta de 87.500 plays e no Youtube 1.890.000 (!!). No Spotify são necessários aproximadamente 356.850 plays de um tema para podermos facturar os mesmos 1.300 euros, valor que obviamente estará sujeito aos respectivos impostos antes de chegar às nossas mãos.

Eu sei que há muita gente que defende que neste momento é obrigatório estar em todas as lojas de venda online por download e em todos os serviços de streaming para que o nosso trabalho seja visível a toda a gente, e em parte isso é verdade. Mas também é verdade que, com o streaming, mais uma vez, o artista/editora está no "final da linha" no que se refere a receber algum dinheiro que é gerado pelo seu trabalho, pelos seus temas produzidos/editados. São inúmeras horas em estúdio, às vezes investimentos em outros artistas, vocalistas, músicos, etc., que, mais uma vez, na minha opinião, não estão a ser devidamente compensados. 

Esta crónica serve também para anunciar que, finalmente, todo o catálogo da Magna Recordings vai estar disponível brevemente nas principais plataformas de streaming. Finalmente temos um acordo razoável com uma distribuidora que nos vai permitir estar também nas restantes lojas online de download (Traxsource, iTunes, etc) assim como nas principais plataformas de streaming como Spotify, Deezer, Apple Music, entre outras. 

Vamos esperar que isso ajude na divulgação de toda a música que já editámos nos 19 anos que festejamos neste mês de Maio e que ao mesmo tempo também seja uma fonte de rendimentos (por pouco que seja...) para a editora e para os artistas. Algo que ajude a recompensar o esforço que temos ao criar e editar música para que vocês possam disfrutar e dançar, seja em casa, no club ou no evento!
 
Carlos Manaça
DJ e Produtor
 
(Carlos Manaça escreve de acordo com a antiga ortografia)
Publicado em Carlos Manaça
terça, 06 dezembro 2016 22:35

30 Anos

Num dia de Setembro de 1986, depois de ter participado em alguns eventos na escola que frequentava (a Escola Secundária de Santo André, no Barreiro, distrito de Setúbal) e algumas festas particulares, fui até à Discoteca “Os Franceses” (chamava-se assim porque ficava por baixo de uma Sociedade Recreativa chamada “Os Franceses”) para “prestar provas” e assim poder começar a trabalhar ali como DJ residente.
 
Foi uma tarde de muitos nervos, com o gerente, alguns empregados e amigos a ouvir o meu “set” feito ali, em directo, para depois decidirem se eu iria ou não ficar como segundo DJ da Discoteca. Aquele que fazia as folgas do DJ principal e passava os “slows”, a música mais calma que se passava numa determinada altura da noite (ou tarde) e onde as pessoas dançavam agarradas. Dois “pratos” com “pitch” (com sistema de correia, o que os tornava bastante “variáveis”) uma mesa de mistura de dois canais (sem equalizador por canal) e alguns discos de vinil escolhidos pelo gerente foram os instrumentos usados para esta avaliação.
 
Apesar dos nervos, de não conhecer os discos e de não ter monitores na cabine (“luxo” que só apareceria muitos anos mais tarde...) a “audição” correu bem e fui aceite como DJ residente. Foi uma sensação inesquecível para mim! Todas as horas passadas a ouvir (e a gravar em cassetes) os programas “Discoteca”, “Som Da Frente”, “Todos No Top” na RDP-Rádio Comercial (entre outros) tinham valido a pena... O meu primeiro ordenado: 25 contos por mês para trabalhar quartas, quintas, sextas e sábados à noite e domingos à tarde! Hoje seriam 125 euros...
 
Em 2016 ano passaram 30 anos desde este momento. Desde essa altura muita coisa mudou no papel que o DJ desempenha num Club. Em 1986 um DJ era simplesmente mais um empregado da Discoteca, cuja função era passar a música que funcionasse melhor para o público do momento, fosse Pop, Rock, Reggae, ou outro qualquer estilo desde que não se “esvaziasse a pista”. Os discos eram comprados pelas discotecas e não pelos DJ’s, por isso os gerentes (que muitas vezes acompanhavam os DJ’s nas compras) também tinham uma  desde que fosse dançsmente acompanhavam os DJs , Rock, Reggae, ou outro qualquer estilo, desde que fosse dançuma palavra a dizer sobre o estilo de música. Nos dias de hoje é difícil imaginar uma situação destas, certo? Mas era assim que funcionavam a maior parte dos Clubs...
 

O DJ é neste momento um dos ícones, uma das principais referências dentro da música, nas suas várias vertentes e estilos.

 
Hoje em dia o DJ é o artista principal da discoteca/evento. É por ele, pela música que ele “toca” (a aplicação deste termo a um DJ dará para outra crónica...) que as pessoas ali se deslocam. Ou pelo menos é assim na maioria dos casos. O papel que um DJ tem nos dias de hoje não tem nada a ver com o que tinha nos anos 80/90, o seu protagonismo é (quase) total, tendo-se mesmo tornado uma estrela Pop nos últimos anos. Quando nomes como David Guetta, Carl Cox, Richie Hawtin, (entre muitos outros) enchem estádios/pavilhões com milhares de pessoas e têm os seus próprios dias nos maiores festivais de música em todo o planeta, facturando milhões, é toda uma geração que os segue. Os DJ’s são, sem dúvida, dos artistas mais importantes do século XXI. Os cantores do momento querem gravar com os nomes mais importantes, as bandas querem remixes suas, o seu nome aparecer num tema é (praticamente) garantia de sucesso. O DJ é neste momento um dos ícones, uma das principais referências dentro da música, nas suas várias vertentes e estilos. Um exemplo a seguir por muitos.
 
É por isso normal que muita gente queira seguir este caminho. Todo o mediatismo gerado à volta da figura do DJ leva a que muitas pessoas queiram, naturalmente, fazer o mesmo percurso, tentar chegar “lá acima”. As novas tecnologias e o seu fácil acesso (e o baixo preço do equipamento, quando comparado com os preços dos anos 80/90 e 2000) tornaram muito mais fácil o caminho para os novos talentos. É bastante mais fácil para uma pessoa com talento e determinação, mesmo com poucos recursos económicos, conseguir produzir um tema com muita qualidade que tenha sucesso nas rádios e que projecte o seu nome como Produtor, o que leva (na maior parte dos casos) a um aumento das suas actuações como DJ.
 
O “ser DJ” tornou-se por isso um objectivo de muitos, o que em alguns casos provocou reacções menos positivas de pessoas que criticam a “banalização” do papel do Disc Jockey. É verdade que houve (e continuará a haver enquanto o DJ tiver o protagonismo que tem hoje) muitas pessoas que “apanharam o autocarro” (os ingleses têm uma expressão para isso - “jump on the bandwagon”) do DJ’ying e que se aproveitam (ou aproveitaram) desse fenómeno e “de repente” também são DJ’s. É uma situação normal e que não vai acabar tão cedo. Mas também é verdade que esta “massificação” nos trouxe alguns artistas de muito talento que de outra forma nunca poderiam ter chegado ao grande público.
 
Para mim 2016 foi um ano muito especial. Foi o ano em que cumpri 30 anos totalmente dedicados à música, deixando para trás uma (possível) carreira como arquitecto. Uma data que sinceramente nunca pensei em atingir, até porque quando comecei a minha carreira, os DJ’s com mais de 30 anos de idade (salvo raras excepções) já eram considerados “cotas” ou “desactualizados”. Foi também um ano de balanço, de pensar em tudo o que aconteceu ao longo destes 30 anos, em toda a música que me “passou pelas mãos”, em todas as horas, noites, tardes, dias passados em estúdio ou a actuar em algum das centenas de eventos onde participei. Na mudança radical do papel do DJ ao longo destes 30 anos...
 

Sinto-me um privilegiado por ter acompanhado todo este processo e por ainda hoje, creio eu, fazer parte do lote de artistas que impulsionou e impulsiona a “Dance Scene” em Portugal.

 
Tive a sorte de estar nos princípios do “boom” da música de dança em Portugal, ao lado das primeiras editoras a arriscar editar música electrónica “Made in Portugal” (das quais a Magna Recordings fez parte), nos primeiros eventos com DJ’s convidados vindos do estrangeiro a actuar em solo nacional e mais tarde nos primeiros mega-eventos de música de dança em Portugal. Sinto-me um privilegiado por ter acompanhado todo este processo e por ainda hoje, creio eu, fazer parte do lote de artistas que impulsionou e impulsiona a “Dance Scene” em Portugal.
 
2016 foi sem dúvida um dos melhores anos da minha carreira, recebi alguns prémios (entre os quais o da 100% DJ), participei em muitos eventos que me marcaram bastante, tal como os “Melhores do Ano da Radio Nova Era” (Porto) em Abril, onde recebi o Prémio Carreira (totalmente de surpresa...); no mega evento “Rock In Rio” em Maio em Lisboa, onde actuei ao lado de nomes como Carl Cox, DJ Vibe ou Octave One, todos referência para mim enquanto DJ’s/Produtores. Uma noite inesquecível!
 
Foi por isso com muito prazer que no final de Outubro estive no Salão de Plenos da Câmara Municipal do Barreiro para receber uma homenagem aos meus 30 anos de carreira, das mãos do próprio Presidente da Câmara. Foi uma total surpresa para mim que a Câmara Municipal da minha cidade se tivesse dado ao trabalho de organizar essa cerimónia onde estiveram alguns dos meus amigos mais próximos, a minha família mas também alguns meus ex-colegas da Escola Secundaria, pessoas que eu já não via há décadas! Nunca eu iria imaginar que, 30 anos depois de passar tantas vezes a pé em frente à Camara Municipal a caminho dos “Franceses” para ir trabalhar, iria estar ali no Salão de Plenos a receber uma homenagem pelos meus 30 anos de carreira das mãos do próprio Presidente da Câmara!!
 
A minha mensagem é por isso muito simples: acreditem nos vossos sonhos, por mais difíceis que possam parecer, dediquem-se o mais que puderem à música se esta for mesmo a vossa paixão. Não vão por “modas”, tentem “tocar” aquilo que realmente gostam, se puderem entrem também pelo caminho da produção, criem os vossos próprios temas, porque, se o vosso trabalho tiver mesmo qualidade, mais cedo ou mais tarde a vossa oportunidade vai (mesmo) aparecer... Eu (ainda) acredito nisso!
 
Carlos Manaça
 
(Carlos Manaça escreve de acordo com a antiga ortografia)
Publicado em Carlos Manaça
Há poucos anos, era comum vermos discotecas a apostar em diferentes estilos musicais. Mesmo dentro da música dita ‘mais comercial’, as discotecas, sobretudo as das grandes cidades, dirigiam-se muitas vezes a públicos diferenciados, explorando nichos de mercado e subculturas que partilhavam os mesmos valores e gostos musicais. As discotecas desempenhavam um importante papel na promoção desses valores, sendo a música a sua principal ferramenta.
 
O aparecimento da cena house em Portugal, no início dos anos 90, foi um exemplo de uma grande subcultura que partiu dos DJ’s, primeiro, e das discotecas, depois, e que surgiu como um fenómeno de contracultura, respondendo à necessidade de quebrar com os unanimismos culturais estabelecidos.
 
Hoje, essa realidade alterou-se profundamente. As discotecas já pouco se diferenciam entre si: todas tocam as mesmas músicas, tendo os hits e a música de cariz popular tomado conta da maioria das casas do país. Arrisco a dizer que nunca como hoje os padrões de exigência estiveram tão baixos. Alguém imaginaria, há 10 anos, uma discoteca reputada de uma grande cidade a tocar o Emanuel? Salvo raras exceções, como o Carnaval, isso apenas seria possível em discotecas de província que, apesar de serem importantes, não ditavam tendências. Faziam parte de um Portugal profundo que nós, gente da cidade, insistíamos em subvalorizar. Por mais comercial que a música fosse, havia uma fronteira que as casas de referência raramente ultrapassavam.
 

"Os atuais empresários e gestores de discotecas parecem não perceber que, ao tentarem dirigir-se às massas, estão a adotar um modelo de negócio esgotado."

 
Hoje, a mesma receita é aplicada a todos os públicos, como se as pessoas fossem todas iguais e partilhassem todas dos mesmos gostos. Os atuais empresários e gestores de discotecas parecem não perceber que, ao tentarem dirigir-se às massas, estão a adotar um modelo de negócio esgotado. A tendência dos negócios, das marcas, do marketing e da comunicação é precisamente a oposta: "Como vivemos numa época de proliferação de culturas, as marcas têm de fazer escolhas. Não lhes é possível agradar simultaneamente a todas as pessoas, muitas vezes nem sequer a uma clara maioria delas"[1] . Não é por acaso que as marcas que têm feito maior sucesso nos últimos anos têm sido aquelas que souberam dirigir-se a nichos de mercado: Red Bull, Smart, Diesel, Apple ou Frize são apenas alguns exemplos.
 
No excelente livro 'A Cauda Longa', Chris Anderson explica porque é que o futuro dos negócios é vender menos de mais produtos, e traça o perfil desta nova economia da cultura e do comércio: os mercados fragmentam-se em inúmeros nichos, que se multiplicam à medida que os custos de produção e distribuição diminuem; por outro lado, os produtos de massas têm tendência a perder fulgor porque vendem cada vez em menores quantidades.
 
Um dos exemplos desta nova realidade é o comércio da música. A venda online de música alternativa – chamo-lhe 'alternativa' para a diferenciar dos hits – já representa uma quota superior à dos próprios hits. A título de exemplo, basta o iTunes vender apenas uma vez todas as músicas do seu stock, para isso representar mais de 20 milhões de músicas vendidas. Ou seja, a música alternativa toda junta tem já um valor económico superior ao dos hits.
[1] João Pinto e Castro, “Marketing Ombro a Ombro”, p. 41.
 
A diminuição dos custos de produção proporcionou a proliferação de diferentes estilos musicais, de inúmeros nichos e subculturas, e uma liberdade criativa sem paralelo na história da indústria discográfica: as editoras têm agora menos poder; os produtores deixaram de estar sujeitos aos caprichos dos A&R, ou quaisquer outros intermediários, e são cada vez mais independentes.
 
Com as lojas online, os custos da distribuição baixaram consideravelmente, resultando num preço de venda ao público bastante reduzido. Sendo a capacidade de armazenamento destas novas plataformas praticamente ilimitada, os seus stocks são gigantescos e permanentes. Resultado: nunca houve tanta música, tão diversificada, acessível e barata como hoje.
 
Mas se a música atual é tão variada, por que razão as discotecas andam todas a tocar o mesmo? É paradoxal que, numa indústria cultural cada vez mais tribalizada, as discotecas portuguesas apostem, como nunca, num modelo de negócio baseado em música para as massas, na música que mais vende no grande mercado – os chamados ‘hits’.
 
 
Apesar de reconhecer que é apenas um lado da realidade, vou arriscar três eventuais razões para este fenómeno.
 
Em primeiro lugar, porque "quando não se sabe para onde se quer ir, qualquer caminho serve para lá chegar". As discotecas são, salvo raras exceções, um modelo de negócio em que o amadorismo e o improviso imperam. Num negócio tão saturado como é o das discotecas, ainda continuam a abrir-se casas noturnas apenas porque sim: não se definem estratégias, não se traçam objetivos; tudo é deixado ao acaso. As discotecas não são geridas como empresas ou como marcas que precisam de ser valorizadas. Uma análise SWOT é ainda, para muitos empresários, um conceito exótico. E ao fim de tantos anos a trabalhar em discotecas, continuo a questionar-me como é que é possível haver tantos empresários com tão pouca sensibilidade para entender a música e as novas indústrias culturais, elementos basilares deste negócio.
 
Em segundo lugar, porque está enraizada a noção de que só a música popular – ou popularucha – é que tem público. É uma ideia muito repetida. Mas será verdadeira? Basta olharmos para os cartazes dos festivais de verão para percebermos que o grande público pode coexistir com as tribos. A programação de grande parte destes festivais assenta precisamente no equilíbrio entre as massas e os nichos de mercado. O Lux Frágil tem seguido uma estratégia idêntica. Mesmo aceitando a ideia de que só a música popular é que tem público, todos sabemos que a música, por si só, não enche uma casa. Quantas discotecas dirigidas para massas estão neste momento vazias ou afundadas em dívidas? Mesmo que não seja de forma consciente, todos temos a noção de que há outras variáveis em jogo.
 
Por fim, porque o recurso à música comercial parece, à primeira vista, o caminho mais fácil. A meu ver, é mais um grande equívoco. Nem toda a gente tem perfil ou está habilitada a trabalhar para as massas. O raciocínio dos empresários que olham para a música comercial como a grande panaceia é mais ou menos deste tipo: "A discoteca X toca música comercial. Está cheia. Logo, a minha discoteca, para estar cheia, tem de tocar música comercial". Esta argumentação é frágil porque a realidade é mais complexa. Há muitos outros elementos a ter em conta.
 

"Mesmo aceitando a ideia de que só a música popular é que tem público, todos sabemos que a música, por si só, não enche uma casa. Quantas discotecas dirigidas para massas estão neste momento vazias ou afundadas em dívidas?"

 
Não escondo que, numa sociedade cada vez mais fragmentada culturalmente, a música popular funciona como um poderoso agregador social. E esta é, quanto a mim, a chave para percebermos o fenómeno que estamos a viver. Mas o que me incomoda não é a música popular em si mesma. Eu também gosto de música comercial. O problema é que há cada vez menos espaço para a diferença. A repetição das mesmas fórmulas e a constante diminuição dos padrões de exigência, por falta de visão e criatividade, estão a transformar as discotecas em bailes de sede. E isso devia, por si só, fazer-nos refletir a todos.
 
Alex Santos
Publicado em Alex Santos
segunda, 04 novembro 2013 14:40

DJs VS Produtores

 
É obrigatório ser DJ e produtor hoje em dia? Um DJ é um produtor melhor? Um produtor é um bom DJ? Saberes fazer música faz com que a tua carreira evolua mais rápido? Aparentemente, hoje em dia quem faz um tão aclamado "hit" passa do 0 para o #40 da DJ Mag - como foi o caso do Martin Garrix, era "desconhecido", e hoje em dia é dos DJs/produtores que mais toca e corre o mundo.
 
Nos clubes e nos festivais o que se ouve são as músicas feitas pelos produtores de música, sempre foi assim e sempre será, são eles que inspiram as pessoas a ouvir e a gostar de música, é por causa deles que as pessoas acabam por sair à noite, para ouvir e se divertir ao som da música deles... e a maior parte dos DJs, são DJs porque se inspiraram em algum DJ/produtor.
 
Mas o reverso da medalha também existe. Se não houvessem DJs, os produtores não tinham forma de sustento, as suas músicas não eram vendidas e não eram tocadas nas pistas de todos os clubes e festivais que existem por esse mundo fora... o DJ é o principal porta-voz das músicas nos tempos que correm - existem cada vez mais clubes, cada vez mais festivais e todas as músicas que saem para o mercado hoje em dia, já vêm acompanhadas com o "remix pack" e na sua grande maioria, já agradam a toda a gente - desde o tech ao trap.
 
Nos anos 80 e 90, não era fácil ser-se produtor de música - tudo era extremamente caro de se comprar e não havia internet com as velocidades estonteantes que há agora, mas acima de tudo, era tudo analógico, não havia muito software. Hoje em dia, com a internet e a pirataria a fervilhar - e como ser DJ/produtor está na moda - qualquer pessoa pode ser um "DJ/produtor", ainda que não saia de casa e tenha apenas um laptop e um DAW qualquer à escolha - pirateado, e meia dúzia de VSTs. 

Um simples DJ acaba por ser como uma banda de covers, nunca toca as suas músicas mas sim os sucessos das outras bandas.

 
Ver um DJ passar a produtor de música é capaz de o transformar em alguém melhor - o facto de aprender a ouvir "não" (das editoras e de outros DJs/produtores), a coragem que é preciso ter para mostrar o seu trabalho - ainda que alguns não têm bem noção do que fazem e só porque os amigos dizem que está "bom" já se acham a "última bolacha do pacote", por outro lado também têm a força de criar algo do zero, do nada, algo inexistente, investir tempo, aprender, evoluir, crescer como artista, como profissional e como pessoa. Um simples DJ acaba por ser como uma banda de covers, nunca toca as suas músicas mas sim os sucessos das outras bandas, podem ser super talentosos e com uma técnica e leitura de pista inacreditável, mas no final, são apenas um "DJ". Claro que um DJ é sempre alguém que cria de uma certa forma e expressa a sua criatividade, mas poucos são os que tentam evoluir e fazer algo inovador e diferente...
 
Um DJ/produtor, por outro lado, é visto como alguém que escreve música, criar e toca os seus próprios temas, faz edits, bootlegs, mashups, procura sempre dar o seu cunho pessoal à música que toca e apresenta aos seus fãs e acrescenta valor à indústria musical, ao mercado que o rodeia e à sua "fan base". 
 
Ao contrário do mundo de um DJ, que na sua maior parte, vive "sozinho" quando está a actuar, porque a cabine é sua e ele é que decide o que vai tocar, um produtor vive em colaborações - podem ser músicos, cantores ou até mesmo outros produtores - isto impulsiona a comunicação, a exploração das fraquezas e forças, a interação, a criatividade e a inspiração - basicamente, aprende-se imenso quando se faz colaborações, tens que ser cordial, saber ouvir e respeitar as opiniões.
 
Quando fazes música estás a ser obrigado a tomar decisões - se vais fazer uma música de house, progressive, tech, trap, dubstep, whatever... que VST's vais usar, que som vais escolher, vais perder tardes a mexer num knob de um synth que altera uma frequência que muda a música toda e és obrigado a seguir em frente, a decidir. Vais procurar uma editora ou pensar se vais abrir a tua própria ou ainda se a vais disponibilizar grátis. Vais enviar a música a todos os teus amigos DJs, vais ouvir "nãos" e vais ouvir "sims". É um processo que não acaba e as decisões são constantes e a maior parte do tempo, tu não tens tempo para parar e pensar - tens que tomar decisões na hora. É um processo criativo, intenso, emocional e divertido... mas no final, super recompensador.
 
 
Daniel Poças
FY2 - The Party Rockers
Publicado em Daniel Poças
segunda, 01 novembro 2021 18:52

«Das duas, três»

Quando tudo parece ter regressado à dita normalidade, as notícias de um eventual regresso aos confinamentos surgem a pesar, mais uma vez, sobre a cultura, mais precisamente sobre o entretenimento, e discotecas, eventos e festivais parecem ser os primeiros da lista.
 
Ou as vacinas demonstram que dão realmente uma proteção elevada para defender os vacinados (e salvaguardar o próprio sistema de saúde), ou seremos obrigados a montar uma operação “Gouveia de Melo, ato 2”. Ou, numa terceira hipótese, encerramos tudo de novo - ou seja: das duas, três!
 
A cultura já foi interditada por motivos políticos (tempos da União Soviética), por motivos religiosos (regime talibã) e agora por motivos sanitários (pandemia da COVID-19).
 
Pois bem, para DJs e produtores de música eletrónica qual é a perspetiva? Para muitos as economias já são escassas, os recursos e as ajudas deixaram de existir - que farão face a uma nova paragem? Terão muitos deles a obrigação de se reinventar ou de mudar de profissão e deixar de fazer o que os apaixona, ou bastará aguardar que se reponham ajudas e esperar que tudo reabra? Mas, na realidade, será que voltarão a ser recordados e amados como em 2019? Será que esta geração de artistas propulsionados pela internet e os seus algoritmos de interação possa tão depressa desaparecer para dar lugar a novas caras? Resumindo: aguardar, mudar de estilo ou, como terceira hipótese, mudar de atividade?
 
E para os profissionais do entretenimento, será que o verão de 2022 vai ser igual aos de 2020 e 2021? Se assim for, interrogo-me sobre o nosso futuro, porque além da questão financeira, fica a sensação de que esta passou a ser uma profissão sem futuro, onde tudo fica remetido a esparsas oportunidades de espetáculos à margem do essencial das nossas vidas. Seremos os empestados que só sobreviverão na marginalidade da lei sanitária em vigor. Das duas, três: esperar que tudo se mantenha como está, candidatar-se a esmola do Estado ou mudar de atividade.
 
É muito importante que os nossos dirigentes entendam que a cultura não pode ser MAIS UMA VEZ encerrada, colocando numa situação desastrosa milhares, milhões, de famílias pelo mundo e decretando o fim de uma atividade essencial para o bem-estar e equilíbrio das nossas sociedades.
 
José Manso
Publicado em José Manso
sábado, 13 junho 2020 23:38

Tempo para meditar

Não faria sentido algum, neste momento, dissociar o mercado dos DJs e Produtores musicais do COVID-19.

Para ser sério, direi que foi o melhor que poderia ter acontecido. Não que tudo estivesse mal mas, a maioria encontrava-se no mau caminho.

Se no que diz respeito aos consagrados pouco haverá a dizer, já que vão garantidamente aproveitar para produzir música, retemperar forças e reaparecer ao seu melhor nível pois possuem situações financeiras que lhes permitem dedicar-se à sua profissão, o mesmo não se poderá dizer da grande maioria e, desta, opto por começar pelos mais novos.

Para estes, melhor do que um semestre de COVID-19 não poderia existir e, embora tema que não vá servir para grande coisa, penso que deveriam ter aproveitado para ler e ouvir música, que julgo ser aquilo que maioritariamente lhes faz falta. Por muito que as pessoas se contorçam com esta afirmação e que a mesma até possa ser vista como afronta, não o é.
 

Mudar, exigiu que os DJs educassem musicalmente o público e, contra ventos e marés, foi exactamente isso que aconteceu.


Se retrocedermos há vinte e muitos anos atrás, facilmente concluímos que, quando a música de dança começou a despertar entre nós, a maioria dos empresários e até clientes, afirmavam à boca cheia que não queriam "martelinhos". Mudar, exigiu que os DJs educassem musicalmente o público e, contra ventos e marés, foi exactamente isso que aconteceu. Dj Vibe, ao contrário do que muitos pensam, não caiu do céu, não foi obra e graça do Espírito Santo. Ouviu muita música e daí, não surpreende que ainda hoje detenha, através da parceria com Rui da Silva - Underground Sound of Lisbon - o maior êxito internacional que algum português alguma vez produziu e que perdura como hino "So Get Up" e que cada um dos seus set's seja uma viagem, naturalmente que uns melhores que outros. Depende do estado de espírito de cada um.

A maioria dos novos Produtores, que serão certamente os grandes da música de amanhã, não conhecem Música além daquela que hoje produzem. Não conhecem, sequer, clássicos de 70/80/90 quanto mais, um pouco de música clássica!

A maioria dos grandes nomes - atenção que estou essencialmente a falar do mercado nacional - foi residente, fez o seu percurso e cresceu. A maioria dos grandes nomes, sabe ir ao baú pois, tem conhecimento, história e arte, a tal arte que aprenderam nos anos 90 em que a máxima era; música é cultura. Se um DJ não educa a sua pista, apenas lhe resta ir copiando o sucesso do vizinho e, daí à maioria das pistas de dança estarem a passar cópias de lixo umas das outras, é o sistema reinante. Ninguém procura ter o seu público procuram sim, copiar o sucesso da pista ao lado seja ele qual for. E os produtores? Fazem exactamente o mesmo!

O COVID-19 veio, se não para safar isto, pelo menos, para voltar a baralhar e para dar de novo. Saiba a nova geração olhar para isto com olhos de ver. Perceber que não é por aquele ser kizombeiro que todos têm que ser kizombeiros ou, porque o que está a dar é a latinada, que Lisboa apenas tem que ouvir latinada em cada porta aberta.
 

Em Portugal, a maioria das rádios passa lixo durante as 24 horas do dia pois, a única preocupação reside nas audiências. Se for Zé Cabra ou Maria Leal que está a dar, é isso que irá passar.


O trabalho das rádios e dos DJs é de educar mas, para educar é preciso ouvir, saber, conhecer e procurar. Em Portugal, a maioria das rádios passa lixo durante as 24 horas do dia pois, a única preocupação reside nas audiências. Se for Zé Cabra ou Maria Leal que está a dar, é isso que irá passar. Quanto mais fácil, brega e sem nexo melhor. Tudo isto seria um cântico gregoriano se os DJs fossem DJs e não, maioritariamente, tipos que, por €50 euros/noite pagos por fora, assumem a categoria dos discos pedidos da senhora que passa a semana a ouvir Maria Leal na rádio e que vê na pista a forma de aplicar os seus trejeitos mundanos entre três vodkas.

Por sua vez, os mais novos, cuja maioria de música pouco percebem, independentemente de existirem alguns com grande valor, ao ser-lhes dada uma oportunidade, agarram-se aos potenciómetros da mesa e aplicam golpes de karate noite fora como que a correr com todos os que estão à sua frente, excepção feita claro está, aqueles vinte que são a sua falange de amigos pessoais e respectivas namoradas. Depois choram-se, o mercado não lhes dá oportunidades, é ingrato, são os malditos lobbies. Não, os proprietários das casas e promotores de festas, precisam é de manter os clientes, não que corram com eles.

Ao contrário daquilo que vou vendo nos cursos para DJs e Produtores disponíveis no mercado, nenhum indivíduo sem o mínimo de cultura musical poderia ter aprovação em qualquer curso destes. É quase como dar uma catana para as mãos de um atrasado mental. Pode alguém que não conhece música educar maiorias? O resultado está à vista de todos e, só não vê quem não quer. Acaba o cliente por ter que fugir, o segurança, saturado, perder a cabeça, o porteiro, preferir ficar do lado de fora da porta, a barmaid utilizar O.B.s nos ouvidos e, claro, o empresário a coleccionar contas, a ter que mudar de empresa e a deixar rasto como o caracol.

Sobre a injecção de "live's" que temos levado nos últimos 70 dias, direi o seguinte. Será difícil perceber que, tirando casos pontuais de festivais - que para mim, mesmo assim, não fazem qualquer sentido - pois ninguém está em casa de castigo a ouvir um doido a gravilhar como se de uma cabine de um jardim zoológico se tratasse! Maioritariamente não há música, há barulho.

Aconselho, para este período, voltarem a ouvir Opus de Eric Prydz até o perceberem. É simples e eficaz, possui musicalidade e é um exemplo moderno de algo com princípio, meio e fim.
 
Miguel Barreto
Publicado em Miguel Barreto
segunda, 16 maio 2022 15:10

Para onde caminha a Noite...

À medida que a pandemia parece estar cada vez mais para trás, a necessidade de capitalização das empresas sobrepõe-se a tudo o resto. Cada vez mais reparo que não interessa muito o que se passa dentro do clube, desde que o mesmo esteja cheio. É pena este tipo de mentalidade, pode parecer estranho, mas acho mesmo que perdemos uma excelente oportunidade para mudar o paradigma da noite no nosso país. Durante a pandemia dei por mim várias vezes a pensar que no meio de tudo o que de mal nos estava a acontecer, pelo menos uma coisa boa seria o facto de todos podermos fazer uma auto-análise que nos permitiria ver como estávamos e víamos as coisas e de que forma as poderíamos alterar. Não resultou...

Independentemente dos gostos musicais de cada um, que podem ser próprios ou por imposição de uma máquina comercial completamente desprovida de consciência, a população mais jovem vai-se perdendo num vazio musical e pessoal onde o que conta é a aparência e a irreverência, seja lá isso o que for para eles. Claro que se pensarmos nisto numa forma mais profunda, por muito que custe ouvir, a culpa começa em casa, como é óbvio, mas para não me desviar do propósito desta crónica, é realmente assustador tentar perceber por onde andará a música dita "comercial" nos próximos tempos, se tomarmos em linha de consideração o que se está a passar agora.

Pelo caminho que as coisas estão a tomar, é óbvio que, salvo raras exceções, cada vez iremos ver menos deejays convidados a pisar as nossas cabines, ou pelo menos nacionais, uma vez que se é para se ser irreverente e cool, que seja em grande, por isso tem que ser internacional, para assim seguir a tendência do mercado. Se queremos ter um público cool e irreverente, temos que os educar dessa forma. Ao menos vejo aqui alguma coerência, há que admiti-lo!

O grande problema actual para qualquer artista nacional com personalidade e identidade musical é que se analisarmos friamente isto tudo com uma perspectiva única e exclusivamente virada para o imediato, obviamente que não faz sentido, do ponto de vista empresarial, estar a contratar um deejay com vontade própria por uma razão muito simples. Se o objetivo é injetar dinheiro na empresa, porquê estar a pagar muito dinheiro, quando praticamente pelo mesmo que se paga a um profissional de segurança podemos ter uma noite absolutamente garantida e não correr riscos? É óbvio que este tipo de pensamento, numa primeira análise rápida, nos faz elogiar os dotes empresariais de qualquer gerente de espaços nocturnos.
Mas infelizmente o que não estamos a conseguir perceber são as consequências que tudo isto vai causar na noite em termos futuros, no seu ambiente, na sua segurança, na forma como todos os profissionais da noite vão poder fazer o seu trabalho, em resumo, na essência da noite.

Na música, muitas vezes ouvi dizer que enquanto o artista mandava na indústria, as coisas iam fluindo. A humanidade artística e a singularidade humana dos mesmos mantinha tudo arrumado nos seus sítios. o problema foi quando a indústria começou a mandar no artista. Uma indústria que não olha a meios para atingir objectivos, que não tem sentimentos, qualquer tipo de amor ou criatividade para dar, uma indústria que apenas vê uma coisa, números. Da mesma forma, também a noite sempre ditou as regras nos clientes, regras essas que eram invioláveis, e que faziam com que a noite fosse especial, com uma mística e um mistério associados até a um ligeiro medo por quebrar certas barreiras, o que de uma forma muito lógica, mantinha o equilíbrio.
 
Mas o tempo passou, e as mentalidades mudaram. Infelizmente parece-me que também na oferta nocturna os papéis se inverteram. Os clientes passaram a mandar na noite. Vamos ver como vai correr... Ou muito me engano ou provavelmente num futuro próximo os protagonistas da noite mais bem remunerados terão que ser mesmo os seguranças, e com muita tristeza digo que uma noite sem segurança, visão de futuro e uma forma de estar comandada de dentro para fora não me parece muito próspera. Espero estar enganado.
 
DJ & Produtor
Publicado em Carlos Vargas
sexta, 02 maio 2014 00:05

A lei do mercado dos DJs

Mas afinal, existe alguma "lei do mercado" que influencie a carreira dos DJ's? Claro que sim. 
No meu último artigo de opinião, escrevi um pouco sobre isso mas não aprofundei este assunto que muitos dos novos DJ's ainda não compreenderam. 
Muitos reclamam por "falta de oportunidades". Oportunidades? Será que colocando um DJ num determinado evento/actuação irá alterar em definitivo a sua carreira? A resposta é NÃO. 
 
A "lei do mercado" que eu falo, não é mais do que a aplicação do termo "Oferta VS Procura" num serviço que é fornecido (serviço de entretenimento). 
Quando existem mais DJ's do que locais ou eventos que necessitam desse serviço, quando a concorrência é mais que muita e numa altura em que a profissão foi "banalizada" devido às facilidades em ser DJ que foram trazidas pela tecnologia, ninguém pode dizer que uma actuação (leia-se oportunidades) vai fazer a diferença e colocar alguém num patamar de relevo. 
Hoje foste tu contratado mas amanhã já há outro para ser contratado. 
 
Um factor que influencia as actuações e onde existem críticas por parte dos DJ's da "velha guarda" ou daqueles mais ligados ao "House" é o tradicional termo "mãos no ar". 
Sinceramente, alguém ainda quer ir assistir à actuação de um DJ que não levanta a cabeça, não olha para ninguém e onde ninguém vê o que ele está a fazer? 
Poderão dizer que a música fala por si... ok. Posso concordar, mas então tirem o "homem" dali e metam um set gravado porque estar a olhar para uma cabine onde estar lá alguém ou não estar, é igual, mais vale meter uma jukebox (isto se o importante for a música). 
 
Não quero dizer com isto que os DJ's terão de fazer "palhaçadas" ou estar sempre aos saltos, mas temos que "exigir" que demonstrem que estão a sentir a música e que transmitam (corporalmente) esse sentimento para o público que pagou para os ver (porque se for só para ouvir, ouvem em casa no Soundcloud). 
 

Infelizmente, assim que um "artista" começa a ter alguma projecção e um elevado número de actuações, pensa logo que o motivo é unicamente ele ser melhor que os outros (...)

Uma outra situação que influencia o mercado é o número de actuações dos DJ's - é sem dúvida alguma, se são representados por alguém ou se têm agente de marcações. 
 
Infelizmente, assim que um "artista" começa a ter alguma projecção e um elevado número de actuações, pensa logo que o motivo é unicamente ele ser melhor que os outros ou que a "sua música ou técnica" é superior aos demais "colegas de trabalho". 
 
Regra geral, esquecem-se que só têm esse elevado número de actuações ou são reconhecidos no mercado porque houve alguém que marcou as referidas actuações ou os promoveu convenientemente para que as possam realizar (solicitações/pedidos de actuação).
Como manager e booker que sou, não faço milagres (tal como qualquer outro colega meu). O que "nós" fazemos, não é mais do que fazer aquilo que um DJ não faz e devido a estarmos inseridos no mercado, é normal que o conhecimento que temos dele seja superior ao de alguém que a sua função não é a mesma que a nossa. O acordo principal que se deve obter é o de que um manager/booker não "mete", nem produz música e um DJ/artista não faz management, nem marca datas. 
 
Quanto à questão monetária entre agentes/agências e artistas, tenho uma opinião muito própria (apesar de também eu não a fazer na maioria dos casos): Se um DJ/Produtor fica com os dividendos da sua produção musical (regra geral) então porque é que quando faz uma actuação, tem de ficar com 70% ou 80% do cachet por 1h00/2h00 de trabalho?
 
Será que sabem quantas horas é que o seu representante teve de trabalhar para ele ter essa actuação ou quanto é que investiu (tempo e dinheiro) para que a actuação fosse solicitada/agendada? Será justo?
É verdade que o agente/agência precisa do produto (leia-se artista) para poder "vender", mas também é verdade que o artista sem ser representado, terá de fazer ele o trabalho do agente e certamente ficará muito mais tempo na "prateleira" (como produto que é). 

Raros são os casos em que a mudança de representante deu bom resultado e, tal como tu, ninguém trabalha de borla ou faz investimentos para perder (...)

 
Como referi anteriormente, nenhum agente/agência faz milagres e se não tiver bons artistas, também não conseguirá fazer alguma coisa. Devido a essa situação é que as tais "oportunidades" não são dadas a quem ainda não tem "valor de mercado" porque não existe o retorno devido, relativamente ao trabalho que um agente ou booker tem. 
 
Nos dias que correm, existem poucas soluções para os artistas. Ou assumem um "casamento" com um agente/agência que irá investir em vocês e no caso de quererem mais tarde o "divórcio", vão ter de pagar pelo trabalho e investimento que foi feito, ou então não são agenciados e trabalham nas duas vertentes e assumem o investimento de tempo e dinheiro (não será certamente a mesma coisa nem obter os mesmos resultados). 
 
Se fores artista (DJ, produtor, Mc, musico, etc.) e estiveres ligado a algum agente ou agência (ou se fores convidado para ser agenciado), nunca te esqueças que a opção foi feita entre duas partes. Caso queiras quebrar essa ligação tenta sempre que seja de uma forma amigável e com os motivos bem claros para que possam chegar a um entendimento, nunca esquecendo que "não se deve cuspir no prato onde comeu". Raros são os casos em que a mudança de representante deu bom resultado e, tal como tu, ninguém trabalha de borla ou faz investimentos para perder onde não tenha de ser devidamente compensado. 
 
A decisão de ser agenciado tem de partir de duas partes (tal como num casamento) mas ninguém obriga ninguém a estar "casado" se não estiver contente com a decisão. No entanto, quando alguém quebra um compromisso, não pode ficar com tudo o que foi construído a dois. "Artistas" há muitos e nunca te julgues melhor que os teus colegas, em especial se o trabalho não foi "só teu". 
 
Nenhum agente ou agência consegue nada "sem ti" mas tu podes ser substituível. Quem não pode ser substituído é quem paga (clientes), quem te promove e apoia (parceiros) e quem te dá visibilidade. Ninguém (como eu) faz milagres e qualquer agente/agência sabe que sozinho nada consegue e muito menos faz com que "tu" (DJ) consigas entrar nesta "lei do mercado". 
 
Afinal existe ou não uma "lei do mercado para os DJ's"?
Sim... existe. E acredites ou não, é exactamente a mesma que para outro produto qualquer. 
Existem "Lobys"? Claro que sim. 
Basta ter qualidade? Claro que não. 
Vais lá chegar sozinho e com o teu trabalho? Nem em sonhos. 
 
Ninguém consegue nada sozinho e enquanto não perceberem que ser DJ ou artista é algo que nada mais é do que um serviço/produto e é regido pelas leis de mercado normais, dificilmente conseguirão que alguém "compre" o que querem "vender".

 

Ricardo Silva
DWM Management
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